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Administratação Pública Cabo-verdiana – Sociedade Unipessoal detida pelo MpD (2)

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  Escrevi, na primeira parte deste artigo, publicada na edição anterior deste periódico, que, por causa da excessiva politização/partidarização, a nossa administração pública é, cada vez mais, percecionada, por muitos cabo-verdianos, como uma propriedade exclusiva de quem exerce o poder. Tal visão reforça a imagem negativa dos partidos e da máquina administrativa, para além de condicionar, negativamente, o desempenho dos serviços públicos e o próprio desenvolvimento do país. Portanto, a questão fundamental que se coloca é a seguinte: como conter os danos da excessiva politização/partidarização da administração pública cabo-verdiana? Não se trata de uma questão de resposta fácil, tendo em conta a sua complexidade. Para isso, impõe-se um debate alargado, ponderado e sem estados de alma. Como afirmara num dos vários artigos que escrevi em 2007, “tem faltado aos decisores políticos vontade política para definir e, sobretudo, implementar um conjunto coerente de princípios gerais e e...

Administratação Pública Cabo-verdiana – Sociedade Unipessoal detida pelo MpD (1)

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  No  já relativamente longínquo ano de 2007, escrevi uma série de artigos sobre o funcionamento do Estado em Cabo Verde, todos publicados no jornal “A SEMANA”, dos quais destaco três, pela sua atualidade e importância: (i) “A Reforma do Estado versus Ciclo Político”; (ii) “Administração Pública: Reforma ou Transformação?”; e (iii) “Cabo Verde versus Corrupção”. Nestes três artigos de reflexão, teci duras críticas aos Governos da década de noventa (liderados pelo MpD) e – objetivamente, com menor incidência – aos Governos em funções de 2001 a 2007 (liderados pelo PAICV), pelas práticas que, na minha perspetiva, não estavam conformes com o que entendo dever ser o ideal republicano. Para além das críticas feitas, apresentei, também, um conjunto de propostas conducentes à melhoria da situação então existente. Uma das críticas feita é a de que “a nossa administração pública era excessivamente pesada, burocrática e sem a qualificação que o novo paradigma político-económico de...

“Princípio de Peter” e triunfo da incompetência em Cabo Verde

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Já em tempos escrevi estar convencido de que uma das razões que ajudam a explicar o atraso no desenvolvimento de Cabo Verde é a prevalência de uma cultura que privilegia os laços de proximidade política, familiar e pessoal em detrimento do mérito, particularmente na Administração Pública (AP), esta entendida no seu sentido lato: administração direta e administração indireta do Governo central e das autarquias municipais. Na verdade , a falta de escrutínio do mérito profissional tem sido um entrave presente e permanente ao progresso e crescimento no país. A partidarização e o nepotismo na AP cabo-verdiana não são fenómenos recentes, mas sim um problema estrutural e persistente, que tem origem na história política e social do país. Ou seja, é um problema que tem origens sociológicas profundas: o país é muito pequeno, praticamente desprovido de recursos naturais e com pessoas muito dependentes do Estado, além de baseadas na família e nos afins, e muito desconfiadas das outras à sua volta....

A insustentável leveza do Governo na gestão do “dinheiro que nunca mais acaba”

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  A insustentável leveza do Governo na gestão do “dinheiro que nunca mais acaba”   A ligeireza com que o Governo trata o dinheiro público já não é apenas uma metáfora caricata do “dinheiro que nunca mais acaba” – tornou-se um fardo real e insustentável para os cidadãos. O Executivo comporta-se como se vivesse num país de recursos ilimitados, ignorando a realidade elementar de que, em nenhuma parte do mundo, o dinheiro é infinito.   A sucessão de decisões políticas que ignoram critérios de eficiência, sustentabilidade e responsabilidade fiscal está a transformar o Estado num organismo inchado, dispendioso e, por vezes, disfuncional. A gestão do erário público assemelha-se a um teatro do absurdo, onde milhares de milhões de escudos – doravante milhões de contos – evaporam-se em empresas públicas falidas, em contratos de concessão e na criação de novas estruturas praticamente sem serventia, em detrimento de uma visão estratégica para o país e da transparência. ...

Um breve olhar crítico sobre as privatizações em Cabo Verde

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  U m breve olhar crítico sobre as privatizações em Cabo Verde Aquando do debate sobre as privatizações, ocorrido no mês de junho passado na Assembleia Nacional, foi tornado público que o Governo assumiu junto do FMI que continua comprometido com o plano de privatizações iniciado em 2018/2019, que ficou suspenso devido à pandemia, envolvendo 23 empresas.   O Executivo “pretende acelerar o processo de modo a criar condições para que o setor privado possa desempenhar, cada vez mais, um papel decisivo no desenvolvimento do país” – adiantou o Ministro das Finanças. As próximas privatizações ou concessões visam, entre outros, os setores da água e da energia (Electra) as telecomunicações (NOSi e CV Telecom), o setor portuário (Enapor) e o aeroportuário (ASA), a produção e comercialização de medicamentos (Inpharma e Emprofac), o imobiliário (IFH), os estaleiros navais (Cabnave), os serviços postais (CTT) e a Escola de Hotelaria e Turismo. Para o Governo, “essas reformas são necessári...

PIB per capita cabo verdiano entre o mito e a realidade

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  As estimativas preliminares apontam para que Cabo Verde tenha atingido 4 300 dólares norte‑americanos (USD) de Rendimento Nacional Bruto (RNB) per capita em 2024. Com isso, o país ultrapassou, ainda que muito ligeiramente, o limite de 4 280 USD fixado pelo Banco Mundial para os países de rendimento médio‑baixo, tendo sido, em consequência, recentemente reclassificado como país de rendimento médio‑alto. A notícia foi recebida com entusiasmo oficial e leitura triunfalista. Já o primo mais próximo do RNB per capita, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita, foi estimado em cerca de 5 329 USD em 2024. No entanto, por detrás da ascensão estatística escondem‑se fragilidades estruturais que, se ignoradas, podem tornar esse estatuto pouco mais do que um mito sofisticado. O mito começa na própria natureza do PIB per capita, que é uma média aritmética que diz pouco sobre a vida concreta dos cidadãos e ainda menos sobre as capacidades reais de desenvolvimento de um país com as caraterística...

Crescimento económico sem melhoria das condições de vida dos cabo-verdianos

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  s   Não obstante as reservas que se impõem quanto à fiabilidade dos dados macroeconómicos e sociais oficiais – por vezes “martelados” e “atamancados” –, o certo é que Cabo Verde evidenciou, nos últimos dois anos (2023 e 2024), taxas de crescimento económico relativamente robustas, em torno de 6,33% ao ano, em contraste com a média de 3,33% registada entre 2016 e 2024. Se estes valores se confirmarem – na medida em que se tratam de dados provisórios –, tal crescimento revela nuances importantes quando analisamos a sua repercussão no tecido social: a criação de emprego (sobretudo entre os jovens), a redução da pobreza e a evolução do coeficiente de Gini, que mede a desigualdade na distribuição dos rendimentos. Essa discrepância entre números e experiências quotidianas convida-nos a questionar até que ponto o crescimento quantitativo alimenta verdadeiramente o bem-estar coletivo.   A história da medição do crescimento económico remonta aos anos 30 do século XX, quando o ec...